Bahia

Patrimônio nacional

Terreiro da Casa Branca celebra 40 anos de tombamento

O Ilê Áse Ìyá Nasò Oka foi o primeiro terreiro brasileiro a ser tombato pelo Iphan como patrimônio cultural nacional

Salvador |
Aniversário de tombamento da Casa foi comemorado em sessão solene na Câmara Municipal de Salvador - Valdomiro Lopes/CMS

O Terreiro da Casa Branca do Engenho Velho, na Av. Vasco da Gama, em Salvador, celebrou nessa terça-feira (04) 40 anos de tombamento como patrimônio cultural nacional. A data foi marcada por uma sessão especial promovida pela vereadora Marta Rodrigues (PT) na Câmara Municipal de Salvador, com a presença de dezenas de líderes do candomblé da capital baiana, entidades do Movimento Negro, blocos afro e autoridades civis e governamentais.

Na Mesa da sessão, discursaram o superintendente na Bahia do Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional (Iphan), Hermano Guanais, representando a ministra da Cultura Margareth Menezes; a Iyá Neuza Cruz de Xangô, da Casa Branca; o professor Ordep Serra; e o vereador Silvio Humberto (PSB), líder da oposição da CMS. Participaram ainda da Mesa da solenidade representantes da Prefeitura Municipal de Salvador e das Secretarias Estaduais da Promoção da Igualdade Racial e da Mulher.

O vereador Silvio Humberto (PSB) cobrou uma efetiva política pública de reparação racial que assegure recursos para a preservação do patrimônio afrobrasileiro e o combate ao racismo religioso. Marta Rodrigues ressaltou que o terreiro é um exemplo sem fronteiras do empoderamento e de resistência na batalha por direitos dos povos negros e da liberdade religiosa. Iyá Neuza agradeceu à união de toda comunidade de candomblé, aos orixás, ancestrais e aos apoiadores da Casa Branca. “Pedimos aos orixás que continuem nos abençoando, vamos continuar lutando, sofrendo todas as adversidades e preconceitos, mas prontos para lutar. A luta foi árdua e continua, a especulação imobiliária quer acabar com o nosso verde”, afirmou.

A representante da Fundação Cultural Palmares na Bahia, Aline Silva, presente na homenagem, saudou a conquista do tombamento por simbolizar a valorização da cultura afrobrasileira.   


Iyá Neuza Cruz de Xangô, do Ilê Áse Ìyá Nasò Oka, participou da sessão solene na CMS / Valdomiro Lopes/CMS

Ancestralidade histórica

O Terreiro da Casa Branca (Ilê Áse Ìyá Nasò Oka, em iorubá) é o responsável pela origem de muitos outros terreiros, inclusive o famoso Terreiro do Gantois, de Mãe Menininha, na Federação, e o Ilê Axé Opô Afonjá, de Mãe Stella de Oxóssi, no São Gonçalo do Retiro, em Salvador. Ele foi fundado por três mulheres africanas da nação nagô e nasceu em um terreno atrás da Igreja da Barroquinha, em Salvador (BA), por volta de 1830.

Primeiro terreiro de candomblé no Brasil e pioneiro no tombamento nacional, o Terreiro da Casa Branca foi reconhecido como Patrimônio Cultural Brasileiro e inscrito nos livros do Tombo Histórico e Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, em 1984.

Segundo o Iphan, os terreiros abrigam um universo simbólico rico em tradições como as danças, cantos, poesias (orikis), mitos, rituais e organizações espaciais que mantêm vivas as memórias ancestrais dos africanos.

Entre 2013 e 2015, o órgão definiu o Plano Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana e realizou o Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC) que mapeou casas de terreiros do Distrito Federal, além de inúmeras ações em outros estados. Representantes dos povos e comunidades participaram dos inventários na região metropolitana no Rio de Janeiro, Distrito Federal, Florianópolis, e dos estudos realizados em Curitiba (PR), Rio Grande do Sul e Palmas (TO).


Lideranças do candomblé, entidades do Movimento Negro e blocos afroestiveram presentes à homenagem / Valdomiro Lopes/CMS

Pioneiro na conquista desse direito à proteção de seu patrimônio, a Casa Branca abriu caminho para outros tombamentos de sítios religiosos negros, totalizando atualmente onze Casas no Brasil: Axé Opô Afonjá, Ilê Iyá Omim, Axé Iyamassé (Gantois), Ilê Maroiá Láji (Alaketo), Bate-Folha e Ilê Axé Oxumaré, em Salvador; Omo Ilê Agboulá em Itaparica (BA); Zogbodo Male Bogun Seja Unde (Roça do Ventura), em Cachoeira (BA); e Casa das Minas Jeje, em São Luis (MA).  

O Superintendente do Iphan na Bahia, Hermano Guanais, fez um histórico desse processo no órgão e elogiou a participação ativa do movimento negro e dos antropólogos Ordep e Olimpio Serra na luta pela preservação da memória cultural da população negra desde a década de 1980. “Essa é uma ação exemplar que mudou a concepção do que é patrimônio cultural no Brasil, fez o Iphan ampliar o olhar para além da cultura eurocêntrica, reconhecer as raízes do Brasil, a diversidade, superar a concepção minimalista e preconceituosa”, afirmou no discurso da solenidade.

Edição: Gabriela Amorim