Minas Gerais

DESAFIOS

Artigo | Dez pontos sobre a conjuntura brasileira após o primeiro ano do governo Lula


Sem romper com o neoliberalismo, não teremos um projeto soberano e sustentável politicamente para o Brasil

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
"Após dez anos de defensiva, faltou unidade e ação para a esquerda que abrisse novo ciclo ofensivo" - Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom / ABr)

1. O terceiro governo Lula melhorou a economia e a vida dos mais pobres. Neste ano, o governo federal retomou políticas importantes; enfrentou os juros escorchantes do Banco Central; aumentou o salário mínimo acima da inflação; denunciou o genocídio Yanomami; deu resposta rápida e contundente com união entre os poderes e governadores contra os atos golpistas de 8 de janeiro; retomou o protagonismo brasileiro nas relações internacionais, atraindo investimentos, ciência e tecnologia; visitou quase todos os países da América do Sul; retomou o Mercosul e o Brics, e indicou Dilma Rousseff para presidência de seu banco; tem pautado a tão urgente transição energética no Brasil e no mundo; pautou a fome e a desigualdade; diminuiu significativamente o desmatamento na Amazônia, na Mata Atlântica e no Cerrado, e as queimadas no Pantanal.

Ainda, o governo Lula mudou a política de preços da Petrobrás; diminuiu a inflação; aprovou um arcabouço fiscal cujo mérito é ser melhor que o Teto dos Gastos; aprovou uma reforma tributária que simplifica o sistema tributário e estava há 30 anos em pauta; montou um ministério com diversidade, ainda que aquém dos nossos sonhos; sustentou Nísia Trindade, Flávio Dino e Silvio Almeida diante de ataques da direita que buscaram derrubá-los; renovou a política de cotas; retomou os conselhos de políticas públicas e as conferências; colocou em pauta a necessidade de ampliar a participação popular nas políticas públicas, entre tantos outros aspectos positivos.

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2. O bolsonarismo se mostrou vivo, forte e atuante, mesmo na defensiva. A extrema direita e suas ideias conservadoras e fascistas construíram forte identidade, senso de comunidade, pertença e adesão na sociedade brasileira. Os valores da direita presentes em toda história brasileira ganharam corpo, e se manifestam na política, nos hábitos de consumo, nas escolhas afetivas, nos gostos culturais, na vida em família, na escola e no trabalho. Fortalecidos nas eleições de 2020 e 2022, ocupam força institucional relevante na direção de 14 estados, incluindo os três maiores do Sudeste, na Câmara dos Deputados, no Senado, nas assembleias legislativas e nas câmaras de vereadores, na direção de inúmeras capitais e grandes cidades.

Bolsonaristas têm aprovado projetos neoliberais e conservadores, no Executivo e nos legislativos, como a Carteira Verde Amarela, o Marco Temporal, a liberação de agrotóxicos, as privatizações, a “escola sem partido” e os projetos de cunho machista e lgbtfóbicos. Eles seguem predominantes em diversas redes sociais com a indústria da desinformação a todo vapor. A maioria dos evangélicos, até o momento, segue fiel ao bolsonarismo. Nas recentes eleições para os conselhos tutelares em todo o Brasil, a extrema direita atuou eficazmente em muitas cidades, envolvendo igrejas evangélicas e mandatos parlamentares, obtendo bastante êxito.

As pesquisas de opinião demonstram resiliência na avaliação positiva da figura de Bolsonaro, mesmo após o escândalo Yanomani, o escândalo das joias, a CPI dos atentados golpistas de 8 de janeiro, o ex-presidente ter perdido os direitos políticos e tantas outras denúncias. Integrantes das polícias militares, da Polícia Rodoviária Federal e das Forças Armadas em geral seguem fiéis às ideias e orientações do bolsonarismo.

3. A direita tradicional, o centro e os meios de comunicação empresariais comprometidos com o neoliberalismo fortalecem a extrema direita e o bolsonarismo. A direita tradicional e seus veículos de comunicação insistem que a disputa política se trata de uma polarização em que os dois polos são igualmente extremados. Sabem que é mentira, mas difundem essa ideia na sociedade como forma de manter a esquerda sob controle. A culpa da polarização seria, portanto, dos dois lados. Não explicitaram para o público nas eleições de 2018, e de lá para cá só dizem que Bolsonaro e seus asseclas são de extrema direita, que defendem ideias fascistas e que têm claramente um projeto autoritário e golpista quando convém.

Mesmo após o 8 de janeiro, esses grupos conferiram espaço abundante às ideias da extrema direita, condenaram ações judiciais e da Polícia Federal, apesar do claro amparo legal diante da gravidade dos crimes. Na área econômica, a censura é total: seguem fechados a qualquer economista ou comentarista que não defenda o neoliberalismo.

No Congresso, o Centrão, cada dia mais à direita, faz extorsão a cada votação, ameaça com a desestabilização e a não aprovação dos projetos do governo, disputa a pauta e impõe desidratações profundas a toda e qualquer proposta que tramite na Casa. De maioria conservadora, e preservando um polo de extrema direita, dá pouca margem para ação quando o jogo se limita às negociações entre seus pares.

Os setores ligados ao Centrão atuam na economia, na política e na sociedade de maneira a manter a esquerda na defensiva, atacando suas ideias, cada vez que as forças progressistas levantam a voz, politizam ou buscam avançar em medidas que democratizem o Brasil. Disputam as ideias liberais diuturnamente por meio da interpretação dos acontecimentos políticos, econômicos e sociais.

Fingem não perceber que defender o projeto econômico neoliberal é defender uma sociedade-sistema-mundo que incorre invariavelmente no autoritarismo, aumento da desigualdade e da degradação social e ambiental. O neoliberalismo, como pensamento político, teoria, ideologia, filosofia e também um sistema normativo, se entranha em todos os âmbitos da sociedade, da vida pessoal e em comunidade. Em razão de sua centralidade na maximização do lucro, além das consequências sociais, leva a humanidade ao abismo ambiental e ao extermínio da humanidade.

4. Dimensão ambiental da crise do capitalismo atravessa o Brasil e torna urgente outro modelo econômico, mas não há sinais à vista. As iniciativas e metas de redução na emissão de carbono, principal medida para frear e reverter o aquecimento global, são ignoradas e postergadas. Medidas paliativas são usadas como cortinas de fumaça. Promessas vagas denotam total distância entre a ciência e o poderio econômico que parasita governos e instituições.

No Brasil, o Congresso Nacional, dirigido pela bancada do agronegócio, das mineradoras e do capital financeiro, tem desonerado emissores de carbono, fragilizado a legislação ambiental e o controle dos agrotóxicos, perseguindo as causas indígenas, perdoado grileiros, desrespeitado o Ministério do Meio Ambiente e pressionado por mais financiamento para uma produção que é insustentável ambiental, econômica e socialmente. A reforma agrária, medida mais eficaz para o combate a fome e as mudanças climáticas, segue com iniciativas muito tímidas e longe de atender em escala necessária. Bem como nossas grandes reservas de lítio, mineral crítico importante para a transição energética, segue sendo escoado sem nenhuma política de agregação de valor ou transferência de tecnologia, por iniciativa de governos estaduais neoliberais.

É preciso dar mais ouvido ao Papa Francisco: “Já são irreversíveis, pelo menos durante centenas de anos, algumas manifestações desta crise climática, como o aumento da temperatura global dos oceanos, a acidificação e a redução do oxigênio. [...] Pequenas mudanças podem provocar alterações importantes, imprevistas e talvez já irreversíveis, desencadeando uma série de eventos em cascata. Nesse caso, chega-se sempre demasiado tarde, porque nenhuma intervenção pode deter o processo já iniciado. Não se pode voltar atrás. [...] Esse cenário é seguramente uma possibilidade, se tivermos em conta os fenômenos já em curso que afetam o clima, por exemplo, a diminuição das calotas glaciares, as alterações nos fluxos oceânicos, a desflorestação das selvas pluviais tropicais, o degelo do permafrost na Rússia”.

A COP 30, em 2025, que terá a tarefa de revisar as metas de cada país na redução da emissão de carbono, e será sediada na Amazônia e liderada pelo Brasil, especialmente por Lula (que tem se tornado a esperança do mundo nessa área), se coloca como momento muito decisivo para o futuro do planeta.

5. Pouco ou nada avançamos para romper com a tutela militar que marca de forma autoritária e decisiva a história e a política no Brasil. Ao não se resolver, a questão militar se mantém de prontidão ao golpismo, conspirando e se preparando para, no momento oportuno, avançar sobre as instituições. Golpes e tentativas de golpes militares estão presentes desde a proclamação da República, passando pelo Estado Novo e o suicídio de Getúlio Vargas, a tentativa de impedir a posse de Juscelino Kubitschek e João Goulart, a imposição do parlamentarismo em 1961 e os golpes de 1964 e 2016.

A complacência do ministro da Defesa com declarações e denúncias envolvendo centenas de militares em desvios, crimes, corrupção, roubos e tentativa de golpe é irresponsável. Não se deve tolerar a politização das Forças Armadas, nem relegar o debate sobre política de defesa aos militares. É pouco auspicioso seguir alimentando os privilégios da categoria, os aumentos nos soldos e gratificações. Pior ainda é permitir a promoção na carreira e a ocupação de cargos estratégicos, como na Abin, de profissionais sabidamente bolsonaristas e golpistas. A recente legislação, dá às polícias militares mais autonomia e mais proximidade com as Forças Armadas, negligenciando inúmeras recomendações de especialistas, o que agravará a violência institucional.

6. Violência estrutural e conjuntural e a ausência de uma política de segurança pública eficiente são calcanhar de Aquiles do governo e da esquerda. A desigualdade, a fome, a pobreza, o racismo e o machismo, atravessados pela crise econômica e social, e pela polarização política, exacerbam a violência que se manifesta na elevação do extermínio de jovens, negros e periféricos e no aumento da população carcerária, da violência contra as mulheres e da intolerância religiosa, sobretudo contra as religiões de matriz africana. Nosso sistema de Justiça, também nas mãos da burguesia, tem sido cada vez mais pressionado a atuar na contenção dos mais pobres, servindo de aparato preventivo à explosão da rebeldia social.

Parte do problema, as instituições de Justiça perpetram violências e discriminações de classe, raça e gênero. Perpetram também privilégios para si, e os amplia, como a recente autoconcessão de dez dias de folga por mês para juízes. O falido combate às drogas agudiza o problema e criminaliza ainda mais a pobreza. Nem o governo federal, mesmo sob o comando de Flávio Dino, muito menos os governos estaduais, mesmo os da esquerda, não oferecem soluções avançadas e estruturais para velhos problemas.

7. A polarização é fato histórico e não se dissipará. Para enfrentá-la e combater o populismo de direita é preciso fazer a disputa política por meio da defesa de um projeto popular e nacional de desenvolvimento, que enfrente os reais problemas do povo. Há uma cristalização de dois polos na sociedade. Aqueles que após a ditadura militar vinham sem condições de expressar e desenvolver sua cultura política, encontraram partido, liderança e a canalização de seus valores, angústias e afetividades. Agora, organizam e influenciam um terço da sociedade, sobretudo as elites e os setores médios, mas também parcelas significativas da classe trabalhadora. Por outro lado, o petismo e o lulismo, hegemônico na esquerda brasileira, também tem adesão de um terço da população e conformam igualmente uma cultura política e uma identidade consistentes. Ambos dotam seus integrantes, simpatizantes ou admiradores de uma chave de leitura do mundo e, com ela, por tabela, a adesão a posicionamentos sobre temas diversos.

A polarização transborda em “problema social” na medida em que um dos polos, de extrema direita, semeia e cultua a figura do inimigo, que precisa ser eliminado, e dissemina o ódio. Ao difundir essa ideologia, estabelece fronteira intransponível entre os indivíduos e os aparta do convívio com o conjunto da sociedade, criando um mundo próprio que se expressará e moldará preferências políticas, culturais, sociais, afetivas, comerciais e profissionais. Oferece soluções fáceis para os problemas, e identifica no “outro e suas ideias” o problema a ser combatido, o inimigo interno, mobilizando afetos e rancores. Ainda, explora questões morais e os símbolos nacionais, mobiliza multidões convictas de estarem do lado do bom, do justo e do correto, quando na verdade estão do lado da manutenção da desigualdade, do cerceamento à liberdade, da opressão, do autoritarismo e da violência.

Não se vence o populismo de direita e a crise do capitalismo com moderação, republicanismo despolitizado e posições centristas. As classes trabalhadoras estão desiludidas com o sistema político, com a economia e com os políticos, sobretudo com estes e seus partidos. Ainda há espaço e vez para a negação da política, outsiders, messias, heróis e salvacionistas (como Milei, na Argentina, ou o PVV na Holanda, extremistas de direita vitoriosos em eleições em seus países em novembro de 2023). As derrotas para a extrema direita mundo afora ensinam que a população não quer mais do mesmo e tem pouca paciência. A estagnada avaliação positiva do governo Lula, mesmo com a melhoria dos indicadores econômicos e sociais, segundo as últimas pesquisas, pode sinalizar essa impaciência.

É preciso fazer a disputa de projeto no campo econômico, social, político, cultural, ambiental e ideológico.

8. Está no centro da disputa política no Brasil o debate de ideias, valores e projeto de sociedade. No entanto, o governo federal e a esquerda não têm feito esse debate. Em uma sociedade fraturada, com um terço dela identificada com a esquerda, outro terço com a direita, é preciso ter atenção ao terço que não se posiciona nem com uns, nem com outros. A disputa de ideias desse terço da população “não posicionado” adquire importância.  A disputa de ideias hoje se complexificou, se fazendo por diferentes plataformas e meios, quase todos eles instantâneos, organizando o consumo, o lazer, a vida financeira e amorosa, as relações de amizade e familiar, a vida política e até religiosa.

Reféns de pouquíssimas megaempresas que dominam as redes no mundo, em que pese o aprendizado jurídico e prático, por parte do STF e TSE, nas eleições de 2018 e 2022, a extrema direita segue encontrando vantagens advindas de algoritmos que impulsionam mentiras e ideias conservadoras. E sobretudo pelo vasto patrocínio que TVs, rádios, jornais, canais de YouTube e perfis em redes sociais, recebem de empresários, do agronegócio, das mineradoras, dos governos de direita e de esquerda. O repasse de recursos públicos para as famosas seis famílias, presentes na frente ampla, que controlam os veículos de comunicação comerciais aumentaram no primeiro ano do terceiro governo Lula.

Não há, por outro lado, por parte do governo, nenhuma política de fomento e sustentação das mídias populares, alternativas e comunitárias. Veículos de esquerda que sobreviveram a Temer, a Bolsonaro e à pandemia estão fechando redações. A composição ministerial, com poucas exceções, não é mobilizadora, mas tem bons gestores, a confiança do presidente e experiência. Mas quantos mobilizam a esperança, a utopia e politizam ao defender o projeto? Nosso melhor jogador segue sendo Lula, que em alguns pontos tem se posicionado e politizado positivamente como nunca, pontuando sempre ao lado dos trabalhadores, o que deveria autorizar aos demais postura semelhante. Também Gleisi, Dino e Silvio Almeida fazem bem a disputa de projeto e valores. Mas não todo governo. Falta enfrentar a mídia comercial e investir na mídia pública, estatal, popular, comunitária e regional. E falta um combate pesado às fake news. Nada disso foi feito neste primeiro ano.

9. Após dez anos de defensiva, faltou unidade e ação para a esquerda que abrisse novo ciclo ofensivo. Estamos vindo de um longo período de defensiva, que se iniciou em 2013, com as mobilizações de junho, a queda forte do PIB em 2014 e 2015, o golpe do impeachment em 2016, a prisão de Lula em abril de 2018 e a eleição de Bolsonaro em outubro. São dez anos de recuo, retirada de direitos, sucateamento do Estado, privatizações e disputa ideológica vigorosa no seio da sociedade. A vitória eleitoral e política em 2022 foi enorme para o Brasil e o mundo. Mas segue na sociedade a disputa política. O fim do período de defensiva está em aberto e passa pela derrota eleitoral, a cassação dos direitos políticos e possível prisão de Bolsonaro.

Um balanço de 2023 precisa se perguntar se o ano foi favorável à abertura de um novo ciclo, agora de ofensiva da classe trabalhadora, com Lula e o PT na presidência da República.

Em 2023, o governo pautou a luta política com temas caros aos movimentos, como diminuir juros, aumentar o salário mínimo, taxar super-ricos e a reforma tributária. Mas, por parte do governo e dos partidos, a ação nasce, vive ou morre entre as paredes do Palácio e do Congresso, sem o envolvimento da sociedade e sem pressionar via mobilizações populares. O que lhes impõem enorme desidratação, levando a aprovação de um arremedo da proposta original, já limitada no berço pelo pensar com “cabeça de frente ampla” que guia o governo.

Fora as iniciativas do governo, em 2023, destacaram-se a Marcha das Margaridas, as ocupações do MST e a ida de João Pedro Stédile à CPI contra o movimento na Câmara Federal.

Em muitos estados, as lutas populares se concentraram em enfrentar os governos neoliberais estaduais, com políticas de arrocho, privatizações, práticas antissindicais, criminalizações, em contexto de maiorias governistas e conservadoras nas assembleias legislativas. A luta das professoras, dos metroviários, eletricitários, sanitaristas e servidores públicos em geral tem sido de combatividade e resistência em todo Brasil.

A luta pela prisão de Bolsonaro, expressa na palavra de ordem “sem anistia”, de forte apelo social para parcela da população, não conta com trabalho consistente e organizado por parte da esquerda para ganhar o conjunto da sociedade para a importância de se fazer justiça no julgamento dos crimes cometidos enquanto era presidente. Entre outros motivos, porque a esquerda segue padecendo de um fórum unitário compatível com o atual arranjo e com forças que se reorganizaram a partir do terceiro governo Lula.

10. Balanço: sem mobilizações de massa e programa, esquerda não aproveitará a oportunidade que se abriu com Lula. Momento exige mais trabalho de base urbano, organização popular, formação política e lutas de massa. Melhoria das condições de vida favorecem a capacidade de luta e influenciam no “humor” da população com o presidente, o governo e também em maior ou menor abertura para as ideias da extrema direita. A polarização tendo em um dos polos a extrema direita é sempre um perigo. É preciso, todavia, reconhecer a polarização como estrutural da nossa sociedade, tendo atravessado os últimos dois séculos da luta política no Brasil. Diante dessa sociedade polarizada, é preciso apresentar horizontes que demonstrem rebeldia, acenem para o longo prazo, tensionando os estreitos limites da política como a arte do possível.

Fora das salas e casas com ar condicionado há muitos que estão com urgência de acabar com a fome, a dor, a miséria, a angústia e a incerteza no futuro, para quem o conceito de correlação de forças diz pouco ou nada. A potência do petismo e do lulismo é enorme e representa ponto de partida muito valioso e promissor. É preciso querer impulsioná-lo. Estão na ordem do dia iniciativas de formação e orientações claras de ações, com espaço para criação e originalidade. Os comitês populares, escolas de formação, jornais, blocos de carnaval e cozinhas populares devem ser estimulados.

A pacificação e a governança a frio não acumulam força. Ao contrário, a esquerda e o governo precisam se preocupar com o fato de que para 2024 não se preveem os fatores que impulsionaram a economia em 2023. Não teremos os mais de R$ 100 bilhões da PEC da Transição, os aumentos substantivos do salário e do Bolsa Família, o aumento do valor das commodities e a expansão da produção do agronegócio – cada vez mais ameaçado pelas mudanças climáticas – e nem a diminuição do desemprego. O arcabouço fiscal que começará a vigorar limitará investimentos, exigirá superávits e arrochos.

A instabilidade internacional coloca mais riscos à economia do ano que vem, e a previsão é de um crescimento tímido, próximo a 1%. Esse contexto trará prejuízos à luta política e social, e afetará as eleições de 2024. Não há como derrotar o bolsonarismo sem melhorar a vida das pessoas.

O novo governo Lula é uma janela histórica para as forças populares, uma oportunidade para acumular forças e não permitir que o neofascismo se entranhe ainda mais na sociedade brasileira. Nos limites do neoliberalismo, essa tarefa não é possível, competindo às forças populares tirar o Brasil das mãos do capital financeiro.

Sem massas nas ruas não romperemos com o neoliberalismo. Sem romper com o neoliberalismo, não teremos um projeto soberano e sustentável politicamente, com a ação decidida do Estado, o crescimento elevado e a distribuição de renda, colocando fim a privilégios e realizando reformas estruturais.

O Brasil tem todas as condições para se tornar uma grande nação. O momento é de oportunidade e precisamos agarrá-la.

 

Frederico Santana Rick é sociólogo, militante do Movimento Brasil Popular e integra a coordenação do Plebiscito Popular em Defesa das Estatais de Minas Gerais.

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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.

 

 

Edição: Larissa Costa