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A energia é verde, mas o bucho tá vazio

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A instalação de aerogeradores na caatinga têm sido sinônimo de desmatamento - Divulgação/Ari Versiani/PAC
Empreendimentos de energia renovável desmataram mais de 4 mil hectares de Caatinga só em 2022

“Porque o vento, ele é diferente em horas do dia”. Quem não se lembra do discurso icônico da presidente Dilma? Apois, há sete anos Dilma foi alvo de mais uma piada por causa do discurso sobre o “estoque de vento”. Anos se passaram e Haddad, atual ministro da Fazenda, ressaltou, na última terça-feira (22), durante a 15ª Cúpula do Brics, na África do Sul, que o Brasil pretende ser fonte de energia limpa para si próprio. Harram, Cláudia, senta lá! Antes de mais nada, preciso dizer que essa pretensão de energia limpa não vem sendo tão boazinha quanto a gente pensa. Ou melhor, como querem que a gente pense.

Atiçados em 2002 pelo Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (ProInfa), os parques eólicos se espalharam pela Bahia, Rio Grande do Norte e Ceará. De acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), na última década, a oferta das fontes eólica e solar registrou crescimento no país, de 92% e 15,5%, respectivamente. Entre 2010 e 2021, os aerogeradores movimentaram R$ 42,3 bilhões, segundo a ABEEólica. Mas qual é o impacto desse crescimento? Mas será que há, de verdade, algo negativo? Energia limpa não é quase a mesma coisa de tomar litros de chá verde para emagrecer?

É preciso entender que para tudo há um custo. A diferença entre o veneno e o remédio está na regência. Dados publicados pelo Relatório Anual de Desmatamento do MapBiomas, em junho deste ano, dizem que os empreendimentos de energia renovável desmataram mais de 4 mil hectares de Caatinga só em 2022. Diante desta informação, nos resta a dúvida: Quais terras são essas? Ora, terras produtivas. Há uma mística na construção identitária nacional que propaga a aridez e a improdutividade da caatinga. Então, tá tudo certo fechar os olhos para esse lado do Brasil. Já não servia mesmo.

A questão que está em jogo, nas terras dos “aviões que nunca pousam”, é a perda de direito ao uso das mesmas, por agricultores. Segundo reportagem do Joio e O Trigo, as terras que as empresas usam para instalar os parques são arrendadas por contratos que duram 40, 50, 60 anos, a depender da situação. Mire e veja, os agricultores que garantiam o mínimo de segurança alimentar, em seu território, têm o usufruto da sua terra cerceado. Enquanto existir turbina eólica, inexistirá a produção de comida. O resultado direto é a mudança nos hábitos alimentares da população local.

Energia limpa, ou verde, é assim chamada porque não esgota os recursos naturais nem gera gases responsáveis pelo efeito estufa durante a geração. É uma excelente alternativa à energia elétrica e às fontes poluentes. Entretanto, é fundamental levar em consideração os modos de vidas e as relações de territorialidade existentes nas comunidades rurais na Caatinga. Se isso não for feito, incentivar [a qualquer custo] a expansão de turbinas eólicas será sinônimo de abater um animal de ordenha. Não fará sentido.

Edição: Gabriela Amorim