Bahia

CELEBRAÇÃO

Trezena de Santo Antônio faz parte de festejos juninos e segue viva na Bahia

Homenagens ao santo trazem à memória o mungunzá servido após as rezas e o pão para colocar na farinheira

Brasil de Fato | Salvador (BA) |

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Tradição da trezena de Santo Antônio valoriza a fé, a cultura e a identidade do povo baiano. - Jamile Araújo - BdF BA

“Se milagres desejais, recorrei a Santo Antônio” diz um trecho do responsório, parte da reza de Santo Antônio, santo português conhecido por ser milagreiro, casamenteiro, e protetor dos pobres e enfermos, que é homenageado no mês de junho, com noites de orações para pedidos e agradecimentos, do dia 1º ao dia 13, data em que teria falecido, em Pádua, Portugal.

A tradição das orações à santo Antônio teve origem na Itália, no século 17, quando uma senhora recorreu ao santo e teve a graça alcançada. A partir de então, outras pessoas rezaram diante da imagem, e, com isso, graças, milagres e devoção se espalharam. 

Na Bahia, as homenagens a Santo Antônio fazem parte dos festejos juninos, junto com as celebrações à São João e à São Pedro, e trazem a memória do mungunzá servido após as rezas, do pão para colocar na farinheira, entre outras comidas típicas.


Os famosos altares dedicados ao santo se espalham por todo estado. / Fernando Vivas - GOVBA

Marinalva Santana, professora aposentada, de 79 anos, conta que começou a rezar para Santo Antônio ainda criança, aos sete anos de idade. “Não rezei para alcançar nenhuma graça, assim por ver rezando, pegava o material da reza, os papéis que as pessoas tiravam do altar, levava para casa e rezava. Quando fiquei adolescente e já tinha meu dinheirinho, comprava materiais e rezava na minha casa”. 

Já a pedagoga Vilma Sousa, de 58 anos, explica que, desde pequena, ela e os irmãos acompanhavam sua avó rezando. “Ela fazia trezena e eu achava muito bonita e interessante. Minha avó faleceu, passaram alguns anos, comecei a me interessar”.

Vilma relata que no ano que seu pai, que vendia peixe na rampa do Mercado Modelo em Salvador, abriu uma peixaria chamada Santo Antônio, ela começou a rezar a trezena. “A partir do ano de 1979, quando foi fundada a peixaria, comecei a rezar, armava o altar na peixaria, e rezávamos a trezena. Passando algum tempo começamos a rezar na nossa casa mesmo. A casa onde nasci, e ainda meus irmãos moram, fica na rua Maria Felipa número 13. A peixaria Santo Antônio, meu irmão chamava Antônio e minha avó rezava trezena de Santo Antônio. Então o santo tem uma ligação na nossa família muito forte”. 

Para cumprir com uma promessa, a baiana de acarajé, Marinalva da Silva, conhecida como Dona Nega, de 58 anos, começou a rezar para Santo Antônio. “Na minha família ninguém nunca rezou. Mas prometi que quando eu construísse minha casa rezaria ele e assim faço, porque sou apaixonada por Santo Antônio”.

Ela diz que acha importante manter a tradição, pois é algo que tem se perdido com o tempo. “Gosto da trezena, gosto de manter a tradição, porque acho muito importante, tenho netas, e quero que elas sigam essas tradições que estão acabando. Muita gente já não faz. E me sinto tão feliz em rezar para Santo Antônio, uma felicidade, uma paz, é amor mesmo”.

Vilma compartilha inúmeras graças alcançadas por ela e por pessoas próximas pela fé em Santo Antônio. “Cada graça que as pessoas conseguem fico muito feliz e agradeço sempre a ele. Minha prima nunca veio para a trezena, nem sabia da existência de Santo Antônio. E quando o marido dela adoeceu, ele é médico, teve covid e ficou em coma desenganado pelos médicos. E eu fiz oração dia e noite, pedindo por ele e pelas outras pessoas que estavam enfermas. Ele sobreviveu, veio agradecer no sábado no dia da festa e se emocionou muito”.


Em Salvador, o Centro de Culturas Populares e Identitárias (CCPI) abriu os festejos juninos de 2022 com o início do tríduo de Santo Antônio. / Lucas Rosário - Secult BA

Há 12 anos Marinalva passou a compartilhar algumas noites da trezena com pessoas que alcançaram graças, ficando responsável pela primeira e última noite. Ela diz que em 2020 e 2021, devido à pandemia de covid-19, rezou apenas com sua filha, mas este ano retomou, mesmo com poucas pessoas. “Hoje eu já estou rezando com poucas pessoas, mas rezando sempre a Santo Antônio e pedindo mais para os outros do que para mim”.

Vilma conta que nos últimos dois anos, apesar de ter arrumado o altar, não rezou a trezena. “Continuei com a fé, com amor. Triste um lado porque não podíamos nos reunir. E aí alguns dias as amigas me pediram para fazer uma video chamada, reunimos um grupo rezamos no dia treze,  cada pessoa em sua casa. Este ano retornei, teve a festa no sábado presencial com 80 pessoas. Foi muito linda e estou rezando todos os dias”.

Dona Nega explica que nos dois primeiros anos de pandemia rezou sozinha com algumas pessoas de sua família e que esse ano ainda não vai rezar os três dias como costuma. “Esse ano vou rezar, mas só uma noite, por conta de outros compromissos. Gosto de rezar dias 11, 12 e 13”. E finaliza: “Santo Antônio na minha vida é tudo, ele é vivo, é presente.  E viva a Santo Antônio”.
 

Edição: Elen Carvalho