Pernambuco

CAMPO

Você sabe o que são as Comunidades de Fundo e Fecho de Pasto?

Modo de viver 100% brasileiro, as comunidades tradicionais se baseiam no uso comum da terra e preservação da Caatinga

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Boa parte das comunidades tem origem há mais de um século e lutam para manter seus modos de viver e produzir - Gui Gomes/Repórter Brasil

A vida na Caatinga, o uso comunitário da terra e a tradição secular de criar os animais soltos são características dos povos de Fundo e Fecho de Pasto. As mais de mil comunidades tradicionais só existem no norte e oeste da Bahia e mantém, há mais de trezentos anos, tradições e culturas próprias.

A vida é simples: os trabalhadores e trabalhadoras rurais se organizam entre terras livres e criam o gado solto. Esse modelo de criação facilita o acesso dos animais à água e à comida, principalmente nos períodos que não há chuva.

Valdivino Rodrigues, articulador estadual das Comunidades Tradicionais de Fundo e Fecho de Pasto explica como a forma de viver gera identificação entre as famílias. “A partir desse conhecimento popular e tradicional foi se construindo essa identidade a partir da própria experiência, da vivência das famílias aqui nas comunidades”

Os fundos e fechos de pasto consistem numa forma de ocupação tradicional de territórios fazendo o uso comunitário da terra com agricultura familiar e mantendo tradições herdadas dos seus antepassados, a exemplo das manifestações culturais e religiosas, como assinala Maiara Cunha, líder comunitária e moradora da comunidade de Santana, em Curaçá (BA).  “Também tem as questões das tradições, da roda de São Gonçalo. Tem a diversidade das religiões, aí tem uma missa, tem um culto, tem as questões dos mutirões, samba de roda”.

Através da luta das comunidades pela regularização fundiária e ambiental das áreas e da Constituição do Estado da Bahia de 1989, esse jeito de viver é reconhecido pelo Estado e os territórios são assegurados no contrato de concessão de direito real de uso, mas eles têm sido invadidos pela mineração. 


Os trabalhadores e trabalhadoras rurais se organizam entre terras livres e criam o gado solto / Gui Gomes/Repórter Brasil

A tendência é que a atividade mineradora desarticule as atividades econômicas e culturais das comunidades, como exemplifica o líder comunitário Luiz Carlos de Andrade. “Os empreendimentos que podemos chamar de intrusos na comunidade vem com um projeto totalmente diferente daquilo que a gente vive. Ele vem numa perspectiva de tirar, de desorganizar toda aquela convivência que a gente tem. Se é de criar animais, fazer um extrativismo natural do umbu… esses projetos que estão chegando na comunidade tem visão diferente, de desarticular esse contexto da gente”, salienta. 

Não é apenas a mineração que ameaça esses povos. Os dados do Relatório de Conflitos no Campo, divulgado em março de 2022 pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), mostram que os povos tradicionais, aqui incluídas as comunidades de fundo e fecho de pasto, estão sendo prejudicados por obras do Ministério de Desenvolvimento Regional e a Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco. 

As obras que estão alagando as terras compartilhadas e reduzindo as formas de viver no campo. Mais uma vez, se reforça a necessidade da manutenção das comunidades pelo seu papel de preservação ambiental, como  explica Valdivino. "Para nós das comunidades tradicionais de fundo de pasto nós podemos nos orgulhar de dizer que somos agentes que contribuem para a preservação do meio ambiente, para a garantia da permanência do povo no campo”, conclui. 

 

Edição: Vanessa Gonzaga